O Poço das Sombras - As Crônicas de Bridei III

"Em missão secreta na Irlanda por ordem do Rei Bridei de Fortriu, Faolan tem também de dar a notícia da morte de um bravo guerreiro. Porém, o principal assassino e espião de Bridei tem de enfrentar os demônios do passado sombrio da sua família com resultados inesperados. Quando segue o rasto de um poderoso clérigo cristão que pode ser uma ameaça para a estabilidade do reino pagão de Bridei, Faolan torna-se responsável por uma criança, um cão e Eile, uma jovem perturbada e desconfiada. Para Eile, a viagem a Fortriu é uma confrontação. Acostumada a uma vida de privações e labuta, a jovem vê-se perante um mundo estranho, cheio de lições novas, onde o principal desafio é aprender a confiar nas pessoas. Na corte de Bridei, em Monte Branco, notícias perturbadoras vindas do reino vizinho de Circinn, levam o Rei a convocar a conselho os seus chefes-de-guerra. Após o desaparecimento do principal conselheiro de Bridei e a morte trágica de uma jovem criada, a ameaça provocada pela influência cada vez Maior da Cristandade parece ser o menor dos perigos..."

Na minha opinião esse foi o melhor livro da série. Na verdade As Crônicas de Bridei se não for a melhor saga, é a mais complexa e rica em abordagem escrita feita pela autora.

Não se tem dúvidas que a série Senvenwaters é surpreendentemente maravilhosa e indescritível. Mas é uma série que se destaca mais em uma trama central, focando mais através de seus protagonistas os seus sentimentos e emoções, em puro romance e magia.

Já em As Crônicas de Bridei a autora Juliet Marillier apresenta principalmente a partir do 2º livro da saga, uma abordagem mais detalhista em suas narrações. Que não só conta com a história de seus protagonistas, como também dos personagens secundários como o druida Broichan, a rainha Tuala, o rei Bridei (protagonistas do 1º livro da saga), o padre Suibne e outros. E se você pensa que fica confuso, se engana, pois a autora com todo seu envolvimento e fluência, conseguiu afunilar com maestria suas histórias e intrigas.

Um outro destaque, é a complexidade que a obra nos revela principalmente através de seus personagens, com suas características distintas e devido sua abordagem histórica muito mais rica e ativa: enfatizando as questões políticas, sociais e religiosas, que aponta as divergências entre a religião pagã e o cristianismo_dando indícios como na História o seu gradual domínio.

Em o Poço das Sombras fiquei encantada com os protagonistas Faolan e Eilie. Com muita emoção você vê a evolução deles: Faolan se tornando muito mais humano, depois de sua mais difícil jornada e Eile devido seu passado triste e traumático, tornando-se muito mais forte e corajosa. Foi maravilhoso ver essa transformação crescente e por ver claramente o quanto Faolan e Eile são reais.

Recomendo muito a leitura. Para mim Juliet Marillier foi a minha melhor descoberta literária do ano...


Apreciação


"Broichan virou as costas ao vale e começou a subir ao abrigo da floresta. Com ele movia-se uma figura encapuzada, de contornos pouco nítidos. Caminha, dizia a voz, e a cada passo que dás, lembra-te. Lembra-te do teu orgulho, lembra-te da tua ambição, lembra-te da tua crueldade.
— Tudo o que fiz — disse Broichan — foi por amor da Aquela que Brilha e do Guardião da Chama. Fui sempre obediente. Toda a minha vida segui o caminho dos deuses e sempre respeitei as suas leis.
Procura no teu coração, murmurou a voz. Examina o passado. Vira o olhar perspicaz da erudição para os teus próprios atos. Aplica a ti próprio o que pregas: o saber não ocupa lugar. Sim, até no reconhecimento de que falhaste em relação à tua própria filha. Como podes tu professar a obediência à vontade dos deuses quando és incapaz de reconhecer o seu dom mais precioso?"
***

"Acabar tudo naquele momento era fazer troça dos homens que tinham saído de lá, tão poucos como os dias secos do Outono. O prisioneiro tocou na estrela que tinha tatuada por trás da orelha. Um sobrevivente. Se o era, não o merecia. Mais valia Echen ter acabado com ele naquela noite. Pelo menos não teria tomado conhecimento dos danos que tinha causado.
Ana: uma razão para continuar, uma razão para não desistir. Faolan pensou lembrar-se, vagamente, de lhe ter feito uma promessa. Era-lhe difícil imaginar-lhe o rosto; tudo o que via era uma neblina dourada e dois penetrantes olhos cinzentos. Como não gostava do seu olhar, Faolan pô-los de lado, tirou a camisa e começou a rasgá-la, servindo-se dos dentes. Em seguida calculou a altura a que estavam as grades da janela. Necessitaria de toda a sua força de vontade porque não estavam muito afastadas do chão, mas era capaz. Porém, teria de esperar. Mais tarde, depois de Seamus lhe trazer o jantar. Tinha de ter a certeza de que não seria interrompido.
Não precisou de muito tempo para atar e torcer os bocados da camisa, conseguindo uma espécie de corda. Uma voz murmurava-lhe na cabeça, uma voz que não conseguia silenciar: a voz de Deord. Faolan via os ombros largos e a cabeça calva do guerreiro na sua cela, de pernas afastadas na penumbra. Maldito lugar. Não me abandones Vive-a por, dizia Deord. Faolan pestanejou e o fantasma desapareceu, mas a voz continuou: Cumpre a tua promessa. Vive a vida que eu te consegui. Vive-a por nós, pelos que não puderam continuar.
Faolan atou a corda em redor das grades e testou-lhe a força, pendurando-se nela. Parecia firme. Talvez, no fim de contas, o fizesse naquele mesmo momento. Se esperasse, talvez acabasse por desistir. Talvez escutasse e se deixasse convencer. Seamus demoraria algum tempo até regressar. Não levava muito tempo a morrer, se estivesse mesmo decidido.
Faolan fez um nó corredio e pôs a corda ao pescoço. Era melhor não pensar. Era melhor continuar...
— Faolan! — A voz vinha do exterior, tão estridente como o grito de uma gaivota. Era Eile. — Faolan, onde estás? O teu pai está aqui! Vimos buscar-te.
Deuses. O prisioneiro levou as mãos ao pescoço, encheu os pulmões e gritou:
— Aqui, Eile. Estou aqui!
— Aguenta-te... — A voz da moça calou-se subitamente. Faolan pensou ouvir outras vozes, apesar de não conseguir distinguir as palavras. Seamus, talvez, e mais alguns homens.
O seu corpo começou a tremer convulsivamente. Lenta, cuidadosamente, como um homem habituado a exercer um controlo total sobre os seus pensamentos e ações, Faolan afrouxou o aperto, desfez o nó corredio, desapertou a suposta corda da grade da janela e, deixando-se cair no chão, começou a desfazê-la. Nas suas mãos, o instrumento de morte transformou-se num monte de trapos e o prisioneiro serviu-se deles para enxugar as lágrimas."

***

6 comentários:

Vivi disse...

È legal ver como essa descoberta literária te motivou, Lili. Seus comentários estão cada vez melhores. Suas recomendações, anotadas.

Beijos

lili disse...

Obrigada Vivi :)
Espero que vc goste tanto quanto eu da juliet Marillier...

Beijinhos

Patricia Cardoso disse...

Lili,

concordo plenamente com você a Juliet Marillier foi um achado maravilhoso, acabei de ler O Filho das Sombras, e já estou louca pra ler as outras trilogias.

lili disse...

Que bom que vc tb adorou Paty :)
Ah, não esqueçe de ler o último livro da trilogia Sevenwaters - A Filha da Profecia!! É lindo...

Beijos

Anônimo disse...

Olá Lili...

concordo plenamete com todos... seus comentarios são inspiradores!
estou no finalzinho desse livro e vim acrescentar que gostei muito da forma como autora descreve e aborda os personagem em toda essa triologia.. acho muito mais interessante qdo se consegue ter uma visão mais detalhada de cada personagem, que fazem parte da trama central e dos secundários, coisa que a Juliet Marillier aperfeiçou nessa saga. Outra detalhe que fez diferença pra mim (alem da abordagem geopolita e descrição do ambiente onde se desenrola a historia), é o fato dos três livros serem um sequencia relatado quase todo em uma decada ou duas... não sei com vcs, mas fazem vc se sentir mais proximo da trama e dos personagem.

é isso... autora, memoravel!
Beijos!
Lú!

Lara disse...

Oi Lili,
a Juliet pra mim foi a melhor descoberta do ano também talvez mais do que do ano seus livros tem o dom de nos prender do inicío ao fim sem em nenhum momento serem chatos.
Desta série O Poço das Sombras foi o que mais gostei senti que a narrativa fluiu de forma mágica.

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